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sexta-feira, 15 de abril de 2011

DIREITO FUNDAMENTAL AO MEIO AMBIENTE SADIO

1. Evolução dos Direitos Fundamentais
A vida em sociedade somente foi possível com a afirmação do Direito, não existindo sociedade sem direito e o direito não sendo encontrado fora da sociedade. A princípio, o direito se limitava a vontade do Soberano, soberania estava nas mãos de uma única pessoa, geralmente um Monarca, por isso, havia sempre abusos, pois esse sistema acabava por dar espaço a uma tirania, assim historicamente os direitos foram surgindo e evoluindo de forma que os direitos fundamentais derivam de uma afirmação evolucionista e historicista, segundo as lições de Norberto Bobbio:
Os direitos do homem, por mais fundamentais que sejam, são direitos históricos, ou seja, nascidos em certas circunstâncias, caracterizados por lutas em defesa de novas liberdades contra velhos poderes, e nascidos de modo gradual, não todos de uma vez e nem de uma vez por todas[1]. (BOBBIO, 1992: p. 5).
No mesmo sentido, assim leciona José Joaquim Gomes Canotilho:
A colocação do problema – boa ou má deixa claramente intuir que o filão do discurso subseqüente – destino da razão republicana em torno dos direitos fundamentais – se localiza no terreno da história política, isto é, no locus globalizante onde se procuram captar as idéias, as mentalidades, o imaginário, a ideologia dominante a consciência coletiva, a ordem simbólica e a cultura política[2]. (CANOTILHO, 2004: p. 9).
Sobre a terminologia de direitos fundamentais, pode-se afirmar que são aqueles contidos e positivados em uma constituição de forma que são fundamentais por servir como base de outros direitos e também da atuação e das limitações do próprio Estado, neste sentido, Ingo Wolfgang Sarlet, assim pontifica sobre o assunto:
(...) o termo direitos fundamentais se aplica para aqueles direitos do ser humano reconhecidos e positivados na esfera do direito constitucional positivo de determinado Estado, ao passo que a expressão direitos humanos guardaria relação com os documentos de direito internacional, por referir-se àquelas posições jurídicas que se reconhecem ao ser humano como tal, independentemente de sua vinculação com determinada ordem constitucional, e que, portanto aspiram à validade universal, para todos os povos e tempos, de tal sorte que revelam um inequívoca caráter supranacional[3].
Portanto, o direito ao o meio ambiente ecologicamente equilibrado passou a ser direito e dever fundamental de toda coletividade, justamente por ter sido positivado na Constituição de 1988.
2.2.2. Direito Ambiental como Direito de 3º Geração
A terminologia gerações de direitos não é utilizada de forma unânime, pois alguns autores se utilizam do termo dimensões do direito, porém, utilizaremos o termo gerações de direitos simplesmente por ser o mais utilizado pelos doutrinadores e também pelo Supremo Tribunal Federal. Os direitos de primeira geração decorreram dos ideais da Revolução Francesa de 1789, correspondiam a limitações impostas ao Estado, que passou a se submeter às leis de Direito, de forma que eram basicamente prestações negativas, inaugurando o Estado Liberal, como concepção de um Estado Mínimo, segundo CANOTILHO:
os direitos de liberdade, cujo destinatário é o Estado, e que têm como objecto a obrigação de abstenção do mesmo relativamente à esfera jurídico-subjetiva por eles definida e protegida.[4]
Porém estes direitos não se destinavam a todos os cidadãos, pelo contrário, a atuação negativa do Estado servia mais aos interesses da burguesia que buscava apenas consolidar a propriedade privada, sendo que, na busca extasiada e cega pelo lucro, ocorriam muitas injustiças, pautadas principalmente na exploração da mão de obra de forma desumana, que chegava tirar das pessoas sua dignidade, neste sentido, o filósofo e doutor em direitos humanos Fábio Konder Comparato, assim pontifica:
(...) a democracia moderna, reinventada quase ao mesmo tempo na América do Norte e na França, foi a fórmula política encontrada pela burguesia para extinguir antigos privilégios dos dois principais estamentos do ancien régime – o clero e a nobreza – e tornar o governo responsável perante a classe burguesa. O espírito original da democracia moderna não foi, portanto, a defesa do povo pobre contra a minoria rica, mas sim a defesa dos proprietários ricos contra um regime de privilégios estamentais e de governo irresponsável[5].
Devido a tantas injustiças, surgem no século XX, as primeiras contrapropostas ao sistema capitalista, que rapidamente ganharam a simpatia de muitos, surgindo as primeiras Constituições a reconhecer os direitos sociais, seja, na Constituição Mexicana de 1917 e na Constituição de Weimar, o Estado deixou de ser mínimo, passou a intervir na esfera privada, normatizando relações entre particulares, para tutelar direitos dos menos favorecidos, regulamentando as leis de trabalho e também atuando de forma intervencionista e assistencialista para garantir direitos inerentes à dignidade humana, tais como a saúde, educação, moradia, etc. Portanto a segunda Geração de direitos corresponde a uma prestação positiva do Estado aos seus cidadão, neste sentido, conforme o magistério de SARLET:
(...) não se cuida mais, portanto, de liberdade do e perante o Estado, e sim de liberdade por intermédio do Estado. (...) Ainda na esfera dos direitos da segunda dimensão, há que atentar para a circunstância de que estes não englobam apenas direitos de cunho positivo, mas também as assim denominadas ‘liberdades sociais’, do que dão conta os exemplos da liberdade de sindicalização, do direito de greve, bem como do reconhecimento de direitos fundamentais aos trabalhadores[6](...).
Colabora com este pensamento a seguinte lição de COMPARATO:
(...) Os direitos humanos de proteção do trabalhador são, portanto, fundamentalmente anticapitalistas, e, por isso mesmo, só puderam prosperar a partir do momento histórico em que os donos do capital foram obrigados a se compor com os trabalhadores[7].
Portanto, os direitos de 2ª geração determinam a atuação positiva do Estado, para que se alcance a justiça social, são direitos de segunda geração os direitos sociais, culturais e econômicos. Com o advento das grandes guerras, principalmente a 2ª grande Guerra, que trouxe a baila a monstruosidade dos massacres e genocídios, os direitos fundamentais foram positivados de forma universal, passando a se destinarem não apenas ao individuo, mas sim e principalmente ao gênero humano, os fundamento da universalização dos direitos fundamentais são a fraternidade e a solidariedade, neste sentido, Alexandre de Moraes:
Por fim, modernamente, protege-se constitucionalmente, como direitos da terceira geração os chamados direitos de solidariedade ou fraternidade que englobam o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado[8].
Assim os direitos de primeira e segunda geração passaram a ser vistos sobre uma ótica coletiva e Universal, outros direitos cuja própria natureza jurídica já era a de direito coletivo, de forma que a titularidade pode chegar a ser indefinida e indeterminada passaram a ganhar relevância, esses são os direitos difusos e coletivos. Dessa forma foi inaugurada a terceira geração de direitos, na qual se insere entre outros, o direito ao meio ambiente equilibrado. Sobre a terceira geração de direitos, Paulo Bonavides ensina:
Com efeito, um novo pólo jurídico de alforria do homem se acrescenta historicamente aos da liberdade e da igualdade. Dotados de altíssimo teor de humanismo e universalidade, os direitos da terceira geração tendem a cristalizar-se no fim do século XX enquanto direitos que não se destinam especificamente à proteção dos interesses de um indivíduo, de um grupo ou de um determinado Estado. Têm primeiro por destinatário o gênero humano mesmo, num momento expressivo de sua afirmação como valor supremo em termos de existencialidade concreta.[9]
Sobre o direito de 3ª geração a alcançar as futuras gerações:
(...) a idéia de que somos todos habitantes de um mesmo e frágil mundo a exigir um concerto universal com vistas a manter as condições da habitabilidade para as presentes e futuras gerações[10].
Sem dúvidas, a doutrina e a jurisprudência asseguram o meio ambiente como direito coletivo, portanto pertencente a categoria de direitos de 3ª geração, conforme decisão do STF:
A QUESTÃO DO DIREITO AO MEIO AMBIENTE ECOLOGICAMENTE EQUILIBRADO. DIREITO DE TERCEIRA GERAÇÃO. PRINCÍPIO DA SOLIDARIEDADE.
O direito à integridade do meio ambiente – típico direito de terceira geração – constitui prerrogativa jurídica de titularidade coletiva, refletindo, dentro do processo de afirmação de direitos humanos, a expressão significativa de um poder atribuído, não a indivíduo identificado em sua singularidade, mas num sentido verdadeiramente mais abrangente, à própria coletividade social.
Enquanto os direitos de primeira geração (direitos civis e políticos) – que compreendem as liberdades clássicas, negativas ou formais realçam o princípio da liberdade e os direitos de segunda geração (direitos econômicos, sociais e culturais) – que se identificam com as liberdades positivas, reais  ou concretas – acentuam o princípio da igualdade, os direitos de terceira geração, que materializam poderes de titularidade coletiva atribuídos genericamente a todas as formações sociais, consagram o princípio da solidariedade e constituem um momento importante no processo de desenvolvimento, expansão e reconhecimento dos direitos humanos, caracterizados, enquanto valores fundamentais indisponíveis, pela nota de uma essencial inexauribilidade.[11].
Portanto os direitos de terceira geração envolvem a todos, seja como titulares ou destinatários, seja como responsáveis pela sua efetivação, são direitos inerentes á cidadania, neste sentido, segundo o magistério de NALINI:
Cada um pode, no universo em que habita, contribuir para tornar o mundo melhor. Esse é um exercício de cidadania. Dispensável a vocação heróica. Basta acreditar na causa. E para crer, basta convencer a vontade. Assim se constrói a democracia. Sem participação da cidadania, não há necessidade de regime democrático.[12]
Destarte, a proteção ao meio ambiente e o alcance ou manutenção do seu equilíbrio depende da participação de todos.


[1] BOBBIO, Norberto. A Era dos Direitos. tradução de Carlos Nelson Coutinho. Rio de Janeiro: Campus, 2005.  p. 5.
[2] CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito constitucional e teoria da constituição. 3ª ed. Coimbra: Almedina, 2006. p. 9
[3] SARLET, Ingo Wolfgang. A Eficácia dos Direitos Fundamentais. 8ª Edição, Porto Alegre : Livraria do Advogado Ed., 2007. p. 35/36.
[4] CANOTILHO, op. cit. p. 375.
[5] COMPARATO, Fábio Konder. A Afirmação Histórica dos Direitos Humanos. 4ª Edição, São Paulo: Saraiva, 2005, p. 50
[6] SARLET, Op. Cit, p. 57.
[7] COMPARATO, Op. Cit, p. 53.
[8] MORAES, Alexandre. Direito Constitucional. 12 Ed. São Paulo: Editora Atlas. 2002.  p. 59.
[9] BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 19ª Edição, São Paulo : Editora Malheiros, 2006, p. 569.
[10] SAMPAIO, José Adércio Leite. Direitos Fundamentais: Retórica e Historicidade. Belo Horizonte : Del Rey, 2004, p. 294
[11] MS - 22.164-0/SP, rel. o Min. Celso de Mello, in DJU 17/11/95, p. 39206.
[12] NALINI, José Renato. Ética Ambiental. Campinas: Millennium. 2001. p. 203.

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